Oly Jr.
FolkRockMilongaBlues

segunda-feira, 28 de junho de 2010







"As idéias estão no ar..."

Esses tempos eu fiz um showzito na Livraria Cultura, que tinha como tema a "Milonga Blues"(conceito musical que "criei" e que dá nome ao meu último disco).

Entre uma música e outra, eu ia dando umas "pinceladas verbais", a respeito de tal conceito, falando de artistas que me influenciaram e como se dá em termos musicais e filosóficos, a mistural da milonga gaúcha com o blues americano.

Bom, no final do show, fiquei por ali confraternizando com o pessoal que foi prestigiar meu trabalho. E eis que, um cara chamado Ludwig Larré, de Santa Maria, me abordou e rapidamente me dizendo que tinha gostado do show e que foi lá só pra ver como era ao vivo e na prática, o conceito "Milonga Blues", pois ele tinha feito uma relação entre o rock 'n' roll e a música nativa do Rio Grande do Sul, há mais ou menos uns cinco anos atrás. E achou interessante essa coincidência do meu ponto de vista ter a ver com o dele.

O fato é que ele fez uma crônica sobre a tal relação, que saiu num jornal chamado "A Razão", de Santa Maria, e que uns dias depois ele me mandou por e-mail.

Li a crônica e achei muito tri. Me fez acreditar mais ainda que as idéias estão no ar.
Nunca tive a pretenção de inventar um estilo musical, mas modestamente, tive a felicidade de captar no ar, uma idéia que estava pedindo para ser concretizada. Acredito que muitas pessoas já devem ter pensado na relação musical entre a música sulista brasileira e a música norte-america. Coube a mim, a façanha de misturar a milonga gaúcha com o blues. Assim como a banda Os Almôndegas misturou o folk daqui com o folk de lá. E creio que outros já devam ter feito suas misturas por aí a fora.

O que o Ludwig Larré percebeu e sentiu, foi o mesmo que eu e de outros tantos gaúchos que amam sua terra e que gostam de arte. Não importa de onde venha. O fato é que tudo na arte se relaciona. E na música não é diferente.

Quando relacionamos alguns tipos de manifestações musicais com outras que, em princípio, são diferentes, e mesmo assim achamos similaridades, é porque nos desprendemos de preconceitos enraizados pela sociedade e tentamos enxergar nos mais diversos contextos musicais, a beleza de seus conceitos históricos e melódicos.
E é assim que nasce um devaneio artístico.

Abaixo a tal crônica:


Rock 'n' Roll com Chimarrão

Leio acordes de "Rock & Roll", o livro do amigo Márcio Grings. A poesia do cara mescla riffs de oportunas soluções melódicas com o groove de pegadas viscerais. Verdadeiros murros poéticos, disparados com a sutileza dos punhos pequenos e certeiros de Henry Chinaski, o alter ego de Charles Bukowski. Nos textos em prosa, Grings embarca clandestino num vagão de carga de um trem sem rumo, com Neal Cassady e Jack Kerouac, e mostra que o beatnik tupiniquim é possível. Está instituída a literatura beatniquim. De quê importa o destino desse trem? "I know, It's only rock and roll, but I like it".

Atitude rock and roll o cara tem de sobra. E eu fico conjeturando o porquê dessa atitude nos envolver tanto enquanto tomo meu chimarrão e escuto um vinil do Clapton com Os Yardbirds. Há uma afinidade de identidades culturais entre o nosso regionalismo e o rock 'n' roll. Gaúchos e Cowboys. Pioneiros, desbravadores, centauros guerreiros. Nossos ancestrais também dizimaram peles vermelhas, antes de se proclamarem donos dessas terras. Lembra disso, cara pálida?

Nossas semelhanças culturais e musicais não param por aí. Repare na coincidência atávica das temáticas da raiz do rock e de nossa música nativa. Compare a simpliciadade melódica dos trê acordes básicos. Acelere a batida de um xote e veja se não dá rock 'n' roll. Costumo fazer essa brincadeira e, pervertendo a Geografia, faço o Rio Uruguai desaguar no Mississippi, ou vice-versa. Transformo "Pára Pedro" em hard rock e "Hotel Califórnia" em milonga.

Uma pesquisa da indústria fonográfica - em função da vendagem do gênero - classificou o Rio Grande do Sul como o estado mais rqueiro do Brasil. Este meu devaneio talvez explique o porquê da nossa identificação inconsciente. No universo imagético - para prestigiar a expressão tão adorada pelos teóricos da comunicação -, confira as semelhanças entre os comerciais de Marlboro e uma cena de campereada numa estância de fronteira. Diga se não há certa atitude rock 'n' roll em um gaudério, de chapéu tapeado, bombeando horizontes de pampa e coxilha com um cigarro de palha no canto da boca.

Bravura, irreverência e liberdade são o que sempre cantaram Noel Guarany, Neil Young, Jayme Caetano Braun, Bob Dylan e outros tantos, de lá e de cá. Existe algo mais blues do "Negro da Gaita"? "E o negro, piá solitário, tal como pedra rolou". Isto é, literalmente, "like a rolling stone", expressão difundida pelo bom e velho McKinley Morganfield - Muddy Waters para os não íntimos - por volta dos anos 50, que depois batizou a banda do Mick, do Keith, do Billy e do Charlie, além de render o hit do Dylan.

E as afinidades vão muito além. Há apelo mais teatino do que "Born to be Wild"? E a vocação jazzística do chamamé? Aumenta que isso aí é rock 'n' roll, tchê! E dá-lhê gaita, Márcio Grings.